A vertigem
Dedo a dedo, as minhas mãos singram por ti acima. Seguem caminhos antigos, bastas vezes percorridos ao longo dos tempos, por outras mãos, em outras mulheres, rotas secretas, uma vez e outra redescobertas, o sabor pungente da novidade adiada a morder-nos a boca, a saltar-nos ao caminho como se fosse um animal feroz emboscado no escuro do nosso desejo.
Buscam os meus dedos o teu corpo: a tua boca que a minha persegue, a tua pele, superfície calma das coisas, de todas as coisas, que a polpa dos meus dedos esgravata levemente, o teu sorriso aberto, a tua gargalhada solta à distância, a pairar de asas abertas sobre este mar que nos aproxima; buscam, incessantes, movidos por este querer incontrolável de te ter, de te dobrar, de te apertar, de contigo fazer sombras chinesas, projectadas no plano vertical da vontade que te tenho.
Dedo a dedo, circundo o teu corpo. Nele desenho vórtices, abismos, profundezas oceânicas, parapeitos vertiginosos de onde me abeiro e te espreito, fatalmente dividido entre a vontade de saltar e o desejo de me lançar, de braços esticados, a pairar de asas abertas sobre este longe que nos separa, irremediável tontura que remédio algum acalma, mitiga ou afasta.
Alexandre Monteiro
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